É muito difícil de definir onde começou a odontologia. Escritas na mesopotâmia, hipócrates na Grécia, Guy de Chauliac mencionando o “dentista” em 1363. Tantos registros difusos que são quase um quebra-cabeças que cabe a nós montar para encontrar onde tudo começou.
Nesse mar de fragmentos, todas as áreas de estudo encontram uma pessoa a quem é creditado uma grande contribuição à essa área, e no caso da odontologia, o francês Pierre Fauchard fez o seu papel publicando o “Tratado dos dentes para os cirurgiões dentistas” em 1728 e ficando conhecido por isso como o “pai da odontologia moderna”, em um registro bem sólido de sua contribuição, e que agora ficou na história.
No momento em que fora publicado, esse livro abriu as portas para milhares de profissionais que viriam em seguida, e por consequência, para todas as especialidades que surgiriam a partir dali.
Apesar da odontologia já ser considerada um nicho mais aprofundado dentro da medicina, ainda é vista como como uma profissão generalista, e com o propósito de tornar cada profissional da área ainda mais apto a tratar da complexidade da face, ainda existem as especialidades.
Da mesma forma que Fouchard é conhecido como o “Pai” da odontologia moderna, as especialidades também tem as suas figuras mais importantes que são reconhecidas por terem feito a sua contribuição para tornar aquela especialidade possível. Da mesma forma, a odontologia do esporte enxerga em Mário Trigo Hermes de Loureiro a figura do seu “pai fundador”.
Falecido em 2008,aos 96 anos, o Dr Mário Trigo deixou no seu livro “Eterno Futebol” algumas lembranças da sua atuação na seleção brasileira de futebol, onde atuou de 1958 até 1970. Foi um dos primeiros, se não o primeiro profissional que dedicou-se a saúde bucal dos atletas, e sabia que, de maneira idêntica à medicina esportiva, a odontologia também precisava identificar as particularidades do atleta para poder contribuir com o seu rendimento e recuperação.
Sabendo como as infecções dentárias interferiam na recuperação e desempenho dos atletas em clubes cariocas nos quais atuou, a presença do Dr Mário Trigo na delegação campeã de 1958 foi importantíssima para que a odontologia esportiva ganhasse o reconhecimento. Quando foi colocado a prova, logo se viu diante do desafio de deixar em ordem a saúde bucal de 33 jogadores.
Como ainda não existiam instalações adequadas dentro da estrutura própria do time, todos esses jogadores exigiram que Mário Trigo comandasse 15 estudantes na clínica da Universidade do Brasil (atual UFRJ na qual se formou, e ofereceu apoio para o trabalho) que fariam anamnese e encaminharam as cirurgias para ele.
Em resumo, ele conseguiu deixar em ordem a saúde bucal dos jogadores e terminando com um saldo de 118 extrações, apesar de ter dito que com mais tempo poderia ter salvado mais dentes.
Isso foi o pontapé inicial para que em 2008, eu pudesse estar coordenando um curso de extensão em Odontologia do Esporte na Universidade positivo, juntos com alguns alunos que também estavam inspirados por esse tipo de trabalho que havia começado quase 50 anos antes, mesmo que não houvesse um reconhecimento formal por parte da academia nessa área.
Uma vez que essa semente estava plantada, esse feito incrível tornou possível que em poucos anos, eu estivesse presente no momento em que uma assinatura tornou oficialmente a Odontologia do Esporte em uma nova especialidade.
Depois de tanto tempo, nenhum de nós teve a oportunidade de ver a odontologia nascer e ser construída, mas dentro dessa nova especialidade, é uma honra ver o início dessa história assim tão próximo de nós.